Reforma Tributária – Simples, simples, simples – Capítulo III

São Vicente em Reforma (Tributária)

Capítulo IIISimples, simples, simples…

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Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho” – Clarice Lispector em A Hora da Estrela.

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  Uma das principais justificativas para a entrada em cena de uma Reforma Tributária está no fato de que o sistema que temos atualmente é um tanto quanto ultrapassado e complexo. Com isto, todas as modificações que surgiram e ainda deverão surgir devem se basear em um novo sistema moderno e simplificado.

 

  Esta premissa é tão patente que diversos dispositivos foram acrescentados ao texto da Constituição Federal como espécie de “mote” para que não se perca de vista tal objetivo, como é o caso do novo §3º do artigo 145 que prevê que o “Sistema Tributário Nacional deve observar os princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária, da cooperação e da defesa do meio ambiente”.

 

  Porém, diante de tanta simplificação, ainda haverá lugar para o Simples Nacional?

  Como sabemos, o Simples Nacional é um modelo de tributação diferenciado introduzido no cenário brasileiro por meio da Lei Complementar nº 123 no ano de 2006. Buscando trazer facilidades sobretudo para as Empresas de Pequeno Porte (EPP) e Microempresas (ME), o Simples Nacional oferece benefícios para as pessoas jurídicas que, dentre outras circunstâncias, não aufiram durante o ano o valor de receita bruta superior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais).

 

  Dentre as facilidades estão as alíquotas diferenciadas dos tributos incidentes sobre a atividade de uma empresa (IRPJ, CSLL, Cofins, PIS, INSS, ICMS e ISS) e a possibilidade de recolher todos estes tributos em uma única guia conhecida como DAS: Documento de Arrecadação do Simples Nacional. Além disto, o Simples Nacional também é conhecido pela contabilidade simplificada exigida diante da dispensa de algumas obrigações secundárias que empresas do Lucro Presumido e do Lucro Real possuem.

 

  Como demonstramos, a intenção da Reforma Tributária é justamente simplificar o sistema tributário sobre o consumo, objetivo este que será alcançado por meio do IVA (Imposto sobre Valor Agregado)[1], novo modelo de tributo que será dividido em dois: IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuições e Serviços), os quais farão as vezes de alguns dos nossos tributos atuais.


Para que não pairem dúvidas, mais uma vez apresentamos como será a substituição dos tributos atuais para o IVA:

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  Logo, se quatro tributos que fazem parte da guia única do Simples Nacional sofrerão uma metamorfose no IVA que surge justamente para simplificar o sistema tributário, haverá razão de existir o Simples Nacional?

 

  Sim! O Simples Nacional continuará existindo. Surgirão novidades neste regime de tributação, mas permanecerá com algumas modificações, conforme as que abaixo demonstraremos.

 

  Atualmente o artigo 23 da LC 123/2006 (Lei do Simples) prevê que as empresas optantes pelo SN não poderão usufruir de créditos de tributos na aquisição de produtos. Portanto, se uma empresa do Simples Nacional adquire um produto cujo ICMS incidente nesta operação foi de R$ 100,00, esta empresa não poderá utilizar tal valor para o abatimento do ICMS devido quando for pagar o DAS mensal.

 

  No caso das empresas do Lucro Real ou do Lucro Presumido, ao adquirirem um produto cujo ICMS na compra foi de R$ 100,00, tais empresas poderão utilizar este valor para abater no ICMS a ser apurado na venda dos seus produtos.

 

  Porém, esta dinâmica poderá ser alterada com a Reforma Tributária. A Emenda Constitucional 132/2023 trouxe uma modificação na Constituição Federal, a qual trouxe a possibilidade das empresas optantes pelo Simples Nacional, a partir de 2033 (quando o ICMS, ISS, PIS e Cofins serão totalmente substituídos pelo IVA), escolherem recolher o IBS e CBS “por dentro” ou
“por fora”. Vamos explicar
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  Como dissemos acima, atualmente o Simples Nacional não permite a sistemática da obtenção de créditos dos tributos anteriormente pagos. Isto, a depender da empresa e da quantidade de bens adquiridos, pode ser prejudicial. Porque se uma empresa tem um alto volume de compras de insumos, por exemplo, e o valor de ICMS incidente nestas operações são altos, a não possibilidade de utilização de créditos de ICMS pode aumentar a carga tributária desta empresa quando considerado os outros modelos de tributação.

 

  O Juiz Federal Mateus Pontalti diz que atualmente as empresas do Simples Nacional são confrontadas com um dilema: “optar pelo Simples Nacional e arcar com uma carga tributária potencialmente mais alta, ou sujeitar-se ao regime de tributação regular, que permite a apropriação de créditos de ICMS, mas implica uma maior complexidade administrativa”[2].

 

Porém, tal dilema cai por terra pela possibilidade das empresas do Simples Nacional, quando da vigência plena do IBS e da CBS, optarem em permanecer no Simples Nacional recolhendo o IBS e a CBS por fora, ou seja, não pela própria sistemática do Simples com o DAS.

 

  Com isto, tais empresas poderão utilizar os créditos do IBS e da CBS e repassá-los na cadeia de consumo. Portanto, as MEs e EPPs poderão usufruir dos benefícios da não cumulatividade dos tributos, situação que não ocorre atualmente.

 

  Está tramitando no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 68/2024 que regulamenta o IVA, e, dentre os seus dispositivos, está a previsão de que as empresas do Simples Nacional que optarem recolher o IBS e a CBS “por fora” deverão fazer esta opção juntamente com a escolha pelo Simples Nacional em todo começo de ano, hipótese em que tal escolha será irretratável durante todo o ano.

  Tal escolha deverá ser muito bem refletida pelos empresários, haja vista que com o ingresso do IBS e da CBS de maneira plena na realidade tributária nacional, a relação das empresas do Simples com seus clientes pode sofrer alteração. Isto acontecerá porque atualmente as empresas do Simples Nacional podem repassar para os seus clientes do Lucro Real as alíquotas “cheias” de PIS (1,65%) e Cofins (7,6%) como créditos na sistemática não cumulativa destes tributos, apesar de efetivamente as empresas do Simples Nacional recolherem valores menores do que os créditos recebidos por seus clientes. Porém, com a promulgação do PLP 68/2024, as empresas do Lucro Presumido e do Lucro Real que adquirirem produtos de empresas do Simples Nacional que não optaram por recolher o IVA “por fora” só poderão utilizar como crédito os valores efetivamente pagos pelas empresas do Simples Nacional.

 

  Neste cenário, as empresas optantes pelo Lucro Presumido ou Lucro Real se verão diante de um desestímulo de adquirirem produtos de empresas do Simples Nacional, o que pode acarretar em grande prejuízo comercial para as empresas no regime favorecido.

 

  Portanto, é necessário que os empresários do Simples Nacional estejam atentos a estas mudanças para que, com tempo suficientemente adequado, possam vislumbrar os impactos e possíveis estratégias diante das mudanças que vieram e virão com a Reforma Tributária.

 

  Ainda haverá muito para se falar do Simples Nacional, principalmente quando a legislação que trata do IBS e da CBS for efetivamente promulgada. Até lá, a São Vicente continuará em reforma para melhor auxiliar nossos clientes a não só recolherem seus tributos da maneira correta e dentro dos prazos, mas para que sejam escolhidas as melhores opções diante das mudanças.

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  Nos vemos semana que vem!

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  1. Para saber mais sobre o IVA, leia nosso primeiro artigo desta série em https://saovicentecontabilidade.com.br/reforma-tributaria-um-convite-a-reforma/.

  2. Pontalti, Mateus. Comentários à Reforma Tributária – EC 132/2023: Entenda o que mudou e por que mudou. São Paulo: Editora JusPodivm, 2024, p. 42.

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